Tenho visto muita discussão por aí sobre o futuro das startups, ao mesmo tempo em que observo um movimento interessante, que talvez seja mais suave no Brasil mas é mais notável no exterior, que é o seguinte: O custo para obter um diploma está cada vez mais alto, enquanto que o custo para começar a empreender está cada vez mais baixo.
Não é difícil refletir sobre isso se você começar a pesquisar o preço de mensalidades nas instituições de ensino mais conceituadas em contrapartida com os poucos passos e baixo custo para abrir um negócio online, por exemplo.
O problema desse cenário é que cada vez mais gente está deixando sua vida normal o que eu acho bom, porque de alguma forma estão saindo da zona de conforto, e deixando a universidade para tentar fazer uma ideia dar certo. Não sou contra, isso tudo é ótimo! apesar de eu não concordar com o “parar de estudar”. Mas isso se torna um veneno quando feito de maneira irresponsável, sem nenhum conhecimento ou experiência, simples como uma ideia na cabeça e um par de chinelos para correr atrás de investidores.
Hoje, a falta de conhecimento de negócio somada à falta de experiência em como empreender é uma das principais causas de falha nos primeiros tempos de vida das startups. Já cheguei a ler que cerca de 90% das startups de tecnologia falham logo no início. Mas a mídia tem mais audiência se publicar o cara de 20 anos que largou tudo e ficou milionário do dia para a noite como se fosse mágica. Bom, sabemos que não é bem assim que funciona.
Para entender o motivo da especulação sobre se estamos ou não inflando uma bolha de startups é preciso entender algumas outras coisas primeiro.
As chamadas “bolhas” se formam quando movimentos de mercado são fundamentados em especulações. Ou seja, o valor de uma empresa aumenta no mercado, fundamentado somente na expectativa de lucro que ela vai gerar.
Isso não te lembra os grandes investimentos em muitas startups por aí?
Pois bem, na década de 90 a Internet começou a cair nas graças do mercado, e todo mundo queria fazer parte da grande rede. Na época ainda existiam poucos serviços disponíveis como a Yahoo e a UOL, que eram bem conhecidos. De cara os investidores viram um imenso potencial na Internet. Foi como fogo no estopim, era revolucionário, diferente, era totalmente “fora da caixa”.
Durante aproximadamente 5 anos (1995 a 2000) todo mundo queria que seu negócio estivesse na Internet para todo mundo ver mas só aos finais de semana e aos feriados, porque era o único jeito de não se gastar uma pequena fortuna com a Internet discada.
Foi então que surgiram as empresas “.com” que eram empreendimentos de todos os tipos, de “faça dinheiro clicando” até venda de legumes pela internet (SIM, DELIVERY DE LEGUMES! o serviço se chamava Webvan e foi investido cerca de US$400 milhões nisso).
Claro que esses novos empreendimentos “.com” seriam um sucesso! Dariam bons retornos em breve.
Pelo menos era isso o que os investidores pensavam e esperavam. Porém, para desespero geral, no ano de 2000 a bolha estourou.
Isso quer dizer que no momento em que as empresas deveriam começar a dar lucro, foi tudo por água a baixo. A verdade é que ninguém sabe explicar ao certo o motivo de isso ter acontecido, mas aconteceu, muita gente faliu, a maior parte das novas empresas foram vendidas ou simplesmente fecharam e ficaram com dívidas enormes.
Mas aonde eu quero chegar falando disso?!
Hoje, o “creme do verão”, o TOP do TOP, o Sexy, é abrir uma startup, é empreender. Os diversos incentivos governamentais, as disciplinas de empreendedorismo nas universidades, a mídia mostrando as startups magicamente milionárias, surtiram efeito e TODO mundo pensa em abrir seu próprio negócio, seja ele online ou não.
E se fizermos um paralelo entre o período que antecedeu o estouro da bolha da internet em 2000 com o período de franco crescimento no número de startups em que estamos vivendo hoje, podemos ver algumas semelhanças.
Há uma enorme movimentação em torno da criação de novas startups e os investidores estão apostando milhões no sucesso delas. O fato é que assim como era com os empreendimentos “.com”, as startups são apostas de sucesso e poucas já começaram a gerar lucro de fato.
A pergunta é, estamos começando a inflar uma nova bolha?
Muitos ainda não acreditam nisso. É muito difícil prever tal acontecimento, mas se voltarmos no tempo, na década de 90, os investidores da época também não pensavam em uma bolha até pouco antes de ela estourar. Assim como com as “.com” da década de 90, o lucro gerado por um startup é apenas projetado, sem fundamentos históricos para tal. Isso dificulta muito avaliar se estamos ou não inflando a bolha.
Para não cair nas armadilhas do “Fique milionário com sua startup”, a dica é pesquisar sobre o mercado, refletir, estar atendo aos movimentos não só no Brasil como no exterior. Em entrevista à revista Exame, Cássio A. Spina, investidor-anjo e fundador da Anjos do Brasil, com sua experiência de mais de 25 anos em empreendedorismo afirma que para escapar de armadilhas é preciso seguir boas fundamentações e não aceitar precificações irreais.
Não sou especialista no assunto, mas meu objetivo é levantar a discussão sobre o tema. É claro, que tudo isso envolve outros aspectos econômicos e sociais como por exemplo, o complexidade burocrática para começar um negócio no Brasil, etc. mas creio que ficar atento e discutir sobre isso é importante.
Publicado originalmente em Café do Programador
6 Comentários
Eu acho que estamos longe de estourar a bolha da startups. Como o texto diz, é “hype” ser um empreendedor jovem, descolado e fora da faculdade. para a mídia.
Atualmente estou no último ano de Sistemas de Informação e as idéias para startups começam a surgir, mas como meu orientador do TCC disse “Nós somos pessoas técnicas, poucos de nós tem uma base administrativa forte.”. Se nós que temos matéria como Administração, Economia, Empreendedorismo na faculdade não temos uma base forte, imagino alguém que aprendeu a programar em Java no segundo ano e resolveu sair para fundar sua empresa qual base terá?
O mercado de T.I. tem a vantagem das perdas não serem tão grande (se comparado à industrias ou comércio), sempre teremos gente entrando e saindo desse mercado em um piscar de olhos.
Tenho de dizer que foi um artigo escrito com louvor.
Realmente quando a mídia divulga esses casos milionários (e raríssimos, embora não divulgado), fomenta-se a falsa ideia de que no mundo de TI tudo é fácil e o dinheiro vem sem problemas e rápido. Não se dá valor ao trabalho, esforço e estudo que devem ser constantemente dedicados para garantir o sucesso.
E, se usarmos a definição de start ups como empresas que ainda não dão lucro, mas tem POSSIBILIDADE de vir ser a rentável, temos uma bolha de núcleos empresariais abarrotando mais ainda as instituições burocráticas em busca da regulamentação, sem ao menos ter um projeto de vida. Pessoas que sequer sabem o que é um fluxo de caixa abrindo empresas e querendo conquistar o mundo.
Sou um defensor ávido do empreendedorismo, e acho que isso é bom para o desenvolvimento intelectual do ser humano (na verdade sempre discurso contra professores de universidades/colégios técnicos que formam a mentalidade do aluno para focar-se em cumprir regras e prazos, e nada de criatividade). Entretanto, temos de ter mais projetos de empresas sólidas, bem embasadas, com projetos firmes. Não digo que é proibido sonhar e arriscar-se, mas isso não deve ser moda ou regra, mas fruto de estudo e embasamento correto.
Você tocou no ponto chave Thiago, é exatamente isso que eu quis dizer. Muitos abrem empresas na ilusão de ficar rico no segundo dia, não levam em conta todo o esforço e ESTUDO envolvido tanto para começar como para manter e chegar ao sucesso.
E ainda acho que deveria aparecer uma frente aí pregando o empreendedorismo responsável, para mostrar como o negócio realmente funciona.
Quanto ao mercado de TI não gerar perdas tão grandes em relação à indústria ou comércio, eu acho discutível. Principalmente porque uma industria por exemplo, normalmente, não surge do nada, é bem planejada.
Em contrapartida muitos novos empreendimentos em TI recebem aportes milionários e quando não dão certo (o que acontece com frequência) deixam os investidores milhões mais pobres mesmo tendo custado o mínimo para ser criada. Mas sim, concordo que isso acontece e vai continuar acontecendo num piscar de olhos no mundo da tecnologia.
Belo artigo Ingrid! Como a mídia só expõe os cases de sucesso, a população acaba fazendo (Especialmente com o setor de TI) a mesma analogia que as crianças fazem com os caixas eletrônicos, “É só ir lá e tirar o dinheiro”, ninguém vê o trabalho, as frustrações e o caminho que a pessoa ou empresa trilhou até “chegar lá”. Já perdi a conta de quantos e quantos amigos meus me disseram “Ou, porque você não faz um aplicativo pra iPhone? Tá esperando o que? Investimento Zero! Teve aquele cara lá que ficou milionário com um joguinho, e vendeu por 2 não sei quantos Mi ou Bi dólares. A se eu soubesse programar…”
Eu tranquei a faculdade pra cuidar de um negócio, mas não foi na loucura (pelo menos do meu ponto de vista rs…), fui “cultivando” a idéia e a empresa até um ponto em que ela se tornou mais interessante do que concluir minha graduação. Mas nem por isso eu parei de estudar, muito pelo contrário, passo mais tempo na teoria agora do que quando era aluno. A diferença é que ao invés de medir meu esforço pela nota, eu meço por rendimento. 3 Anos se passaram e eu ainda não fiquei milionário financeiramente, mas tenho o prazer de fazer todos dias o que eu mais gosto (e ser recompensado com um pró labore razoavelmente bom). Se o BOOM das startups é um bolha eu não sei, mas se for, eu estou adorando flutuar em uma rs…
Para conhecimento o FINEP está lançando uma linha de crédido específica para Startups:
http://www.finep.gov.br/imprensa/noticia.asp?cod_noticia=3163
Wallace Oliveira
http://www.supravizio.com
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