Carreira: Não faça o que você ama!

Cal Newport, autor do livro So Good They Can’t Ignore You concedeu uma entrevista à Eric Barker, ex-colunista do Wired Magazine, sobre seu livro e porque fazer o que você ama pode não ser uma boa ideia quanto ao que diz respeito a sua carreira.

Não faça o que você ama! Ame o que você faz.

Essa é uma frase um tanto quanto polêmica. Cal pesquisou uma simples questão que volta e meia alguns de nós nos fazemos, que é: “Como as pessoas acabam amando aquilo que fazem?” ou, além disso, o que significa amar seu trabalho?.

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Se você começar a perguntar isso para as pessoas por aí, a resposta mais comum que você vai encontrar é: “Elas seguiram a paixão delas, aquilo que elas realmente amam fazer!”.

A pesquisa de Cal então era: Isso é verdade? Será que aquelas pessoas que acabam amando o trabalho que fazem realmente seguiram aquilo que elas amam fazer? Elas seguiram a paixão delas? Cal chegou à conclusão de que dizer a alguém para fazer aquilo que ela ama pode se tornar um péssimo conselho.

Mas peraí Ingrid, você está dizendo que a pesquisa do Cal concluiu que “Fazer o que eu amo” é diferente de “Ser apaixonado pelo que eu faço”? Não entendi nada!

O fato é que a maioria das pessoas que alcançaram o sucesso e fazem o que amam, não começaram suas carreiras seguindo suas paixões. O erro fundamental da maioria das pessoas é pensar que a satisfação profissional a longo prazo, só é alcançada se combinarmos o trabalho com as atividades que despertam maior interesses em nós. Parece tão óbvio que deveria ser verdade! Mas, segundo Cal, para a maioria das pessoas que acabaram alcançando grande satisfação na vida profissional isso não passa de conto de fadas. Elas não fizeram das atividades que mais lhes interessavam um trabalho.

É errado pensar que todos nós temos uma “paixão pré-existente”, aquilo que nascemos para fazer nossa vida inteira e que só fazendo essa coisa é que podemos alcançar a satisfação profissional. O problema é que a maioria das pessoas não sabem do que gostam, não têm uma paixão pré-existente por algo, ou simplesmente gostam de várias coisas, e se fossem fazer tudo ao mesmo tempo precisariam de mais umas 4 vidas. O autor menciona um estudo bastante interessante, em que mais de 500 universitários foram entrevistados, e foi descoberto que menos de 4% deles conseguiram identificar uma paixão que tivesse relação com suas carreiras.

O que Cal encontrou durante sua pesquisa com pessoas que acabaram, em algum momento da vida, amando o rumo que suas carreiras tomou foi: A longo prazo, o que traz satisfação profissional é ter senso de autonomia, reconhecer o impacto que você está causando no mundo, saber exatamente em que você faz diferença na vida das pessoas; conseguir reconhecer que você é bom naquilo que faz, e ter a sensação de estar realmente conectado com as outras pessoas. E tudo isso não tem a ver diretamente com o trabalho que é executado diariamente ou com uma paixão pré-existente que todos nós achamos ter a obrigação de descobrir um dia Eu pelo menos achava.

Como ser bom naquilo que você faz.

O que Cal sugere para que nos tornemos mestres naquilo que fazemos é primeiro identificar quais habilidades estão envolvidas no trabalho que realizamos. Precisamos de feedback, ter alguma noção de “nossa, eu sou bom nisso!” ou “cara, eu preciso melhorar nisso aqui”.

O segredo é se perguntar: “Quão bom eu sou nisso?” e “Fazendo isso eu sou melhor do que fazendo nada?”. Às vezes é preciso praticar essa espécie de auto-coaching. Além disso, quando estiver trabalhando é preciso estar 100% focado na atividade, você deve persistir na melhora contínua do que você faz, deve se esforçar para permanecer fora de sua zona de conforto. É lá que as coisas acontecem!

O que você está fazendo de errado na tentativa de ser um mestre naquilo que faz?

Cal diz que, na tentativa de se tornar excepcional naquilo que fazem, a maioria das pessoas busca encontrar um certo “fluxo” contínuo de execução. Ou seja, um estado de satisfação com o que se está fazendo, aquele momento em que você está tão absorvido pela atividade que não vê o tempo passar, aquele momento em que você está fazendo uso pleno de suas habilidades e você se sente completamente no controle da atividade.

No entanto, só melhoramos nossa performance quando nos forçamos a permanecer em estado de “tensão”. O que Cal quer dizer é que precisamos sentir dificuldades, sentir que estamos nos esforçando. Isso não é estar confortável e, definitivamente, não é se sentir no controle da situação.

É legal fazer uma analogia entre o sugerido por Cal e a prática de exercícios físicos. Se queremos ganhar massa muscular, levantar todos os dias 5Kg só vai nos tornar bons em levantar 5Kg, não estamos realmente trabalhando o músculo e fazendo ele se desenvolver mais.

Devemos procurar fazer coisas além de nossas atuais habilidades. Isso não é confortável e não é estar no controle. Sua mente vai te dizer a todo momento: “Isso está terrível! Você é péssimo nisso! E se você parar um pouco para checar seu e-mail? e seu Facebook como vai?”.

No fundo nós sabemos que se persistirmos em fazer somente o aquilo que já sabemos, cairemos imediatamente na mediocridade. Evitar o desconfortável é o maior erro que alguém pode cometer. Faça daquilo que lhe é desconfortável um aliado no desenvolvimento de novas habilidades e melhoria das que você já possui.

O segredo do sucesso é ser um artesão.

O que Cal nos aconselha para alcançarmos a completude na vida profissional é lançar mão da crença de que devemos fazer aquilo que amamos, e parar de nos perguntar “O que esse emprego me oferece de bom? Eu estou feliz nesse emprego? Este trabalho está me dando tudo o que eu quero?”. Ao invés disso devemos começar a nos perguntar: “Quais são os efeitos que meu trabalho está causando nas outras pessoas? Qual meu valor e o valor do que eu faço? Como eu posso melhorar?”.

Acha um absurdo ter sua satisfação ligada ao impacto que você tem no mundo?! Muito filosófico para sua mente?!

Então imagine o seguinte cenário: Você é funcionário de uma empresa que fabrica válvulas de vapor, e você está um uma reunião anual aonde estão presentes todos os executivos da empresa e todos os funcionários. O CEO começa seu discurso agradecendo a todos os funcionários, diz bom dia, e começa a falar sobre uma pequena cidade do interior do país.

O seu “chefe” está dizendo para você e para o resto dos funcionários: Obrigado a todos vocês! Na cidade X, nasceram 350 bebês no último ano e os hospitais de lá salvaram 1800 vidas por meio de cirurgias. Nada disso teria sido possível se eles não estivessem utilizando 40 das nossas válvulas de vapor que carregaram oxigênio e gases através do hospital. Obrigado a todos vocês porque na cidade Y, nesta manhã, vários pais deram café da manhã a seus filhos, vestiram eles, levaram-nos até o colégio, e depois foram para o trabalho. E nada disso teria sido possível se a companhia local de gás e eletricidade não utilizasse 400 unidades de nossas válvulas de vapor. Essas válvulas foram feitas por vocês, então muito obrigado!

Achou um pouco surreal?! Mas acredite, eu não inventei esse diálogo, ele realmente aconteceu, nos EUA, quando o CEO de uma fábrica de válvulas de vapor fez seu discurso para 350 funcionários no encontro anual da firma. A cidade X é uma cidade do interior de Nova York, e a cidade Y é uma cidade ao ocidente da Pennsylvania.

Imagine-se sendo um dos 350 funcionários. Como você se sente? Ainda acha um absurdo se perguntar “Quais são os efeitos que meu trabalho está causando nas outras pessoas? Qual meu valor e o valor do que eu faço?” ao invés de “O que esse emprego me oferece de bom? Eu estou feliz nesse emprego? Este trabalho está me dando tudo o que eu quero?” ?

Ser como um artesão quer dizer que você deve encontrar satisfação no desenvolvimento de suas habilidades, e a partir do momento em que você se tornar bom nela deixar que ela tome conta de sua carreira, trabalhe nela, melhore ainda mais, faça coisas que sejam significativas com elas, cause impacto no mundo com seu trabalho, seja tão bom que ninguém possa te ignorar.

E acima de tudo lembre-se: Um artesão não é aquele que checa as redes sociais a cada 5 minutos. Não estão procurando por conforto nas tarefas que executam. O que eles fazem é ficar horas e horas treinando, melhorando ou adquirindo novas habilidades. O pensamento de um artesão é único: “Isso é muito difícil, mas eu vou me esforçar até me tornar realmente bom nisso.”.

Falhas devem te dar mais força. Dificuldades devem ser sua motivação! Não existe dom divino, existe trabalho árduo. Torne-se uma lenda.

 

Publicado inicialmente em: Café do Programador

Ingrid Marçal

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Bacharel em Ciência da Computação pela FCT-Unesp. Atualmente cursando pós-graduação em Gerenciamento de Projetos pela instituição SENAC. Apaixonada por tecnologia e gestão, adora compartilhar ideias e levantar discussões sobre assuntos interessantes envolvendo TI.


7 Comentários

alfrdor
3

Otimo texto… Eu mesmo sou um daqueles que gostaria de fazer 1000 coisas ao mesmo tempo, mas em nossas vidas temos que escolher um unico emprego, e nele encontrar satisfação, mesmo que seja aquilo que não amamos. Eu, no caso, trabalho com algo que gosto (TI) mas sou apaixonado por música, a musica faz parte do meu Hobby, a tecnologia faz parte do meu trabalho.

Isac
5

Muito bom o texto, me ajudou a refletir sobre o momento em que estou passando na vida e encarar com uma possibilidade diferente.
Obrigado!

Ramos
7

Parabéns pelo post e muito obrigado pelo puxão de orelha.. Me encontro numa fase de inicio de carreira onde tudo e’ incerto, tentando seguir mil e uma coisa pela grande armadinha do faça o que você ama.

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