Os desafios de uma cultura projetizada em ambientes cáoticos

Após a publicação do meu último artigo, “O Gerente de Projetos do Futuro”, recebi um comentário muito pertinente do leitor Wilson Garperef sobre nada adiantar termos o gerente do projeto com o perfil que descrevi no artigo se a estrutura organizacional não contribuir para uma boa prática de gestão de projetos. Tomo a liberdade de reproduzir abaixo o comentário do leitor:

“Acredito que para muitas empresas que hoje em dia não tem o mínimo gerenciado, o Gerente de Projetos do Futuro apresentado será visto como um santo milagreiro que colocará tudo em ordem.
Penso que, se as organizações não se organizarem, estão com certeza fora do mercado. Mas para que uma destas organizações possam ter um Gerente de Projetos, ela tem que se adequar de forma planejada e gradual.
Já presenciei o desastre de uma empresa sem nenhum tipo de procedimento ou cultura voltada para projetos contratar um gerente projetos. Como disse, foi um desastre, pois a cultura da empresa era mais forte. O gerente de projetos contratado até que tentou bastante, mas não conseguiu gerir um projeto sequer.

Devido ao fracasso, hoje a empresa capacitou seus gerentes e supervisores para pensarem mais em questões de organização e projetos.
Depois disso é que o gerente de projetos conseguiu desenvolver seu trabalho.

As capacidades que o gerente de projetos deve ter estão claras e concordo, mas de nada adianta se ele cair numa empresa onde a cultura seja do fazer fazendo.”

Imagem via Shutterstock

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Depois de ler esse comentário pensei o quanto poder ser difícil, ou até mesmo impossível, implementar uma cultura projetizada em determinadas estruturas. Abaixo descrevo alguns cenários de estruturas que podem tornar a vida do gerente de projetos um tanto desafiadora:

1) Cultura do “fazejamento”

Estruturas onde reinam o caos e a total falta de planejamento, onde a prioridade de ontem torna-se o segundo plano de amanhã. Também costumo chamar de “gerenciamento bumba-meu-boi” ou “vamos-que-vamos”. Cenários de total improviso, com projetos com constantes atrasos e estouros de orçamento.

Chances de sucesso de implementar uma estrutura projetizada: implementar aos poucos e em projetos menores, para diminuir o impacto da migração de um ambiente de “fazejamento” para um ambiente de planejamento e principalmente ter um forte apoio do corpo diretivo da empresa.

2) Cultura do “aqui sempre foi assim”

Um derivado da cultura do “fazejamento”, mas em empresas onde a maior parte de seus funcionários trabalham há anos na empresa. “Mas Vitor, para que mexer se bem ou mal sempre foi assim?” – é o argumento clássico.

Chances de sucesso de implementar uma estrutura projetizada: Forte apoio do corpo diretivo e um forte trabalho de disseminação de conhecimento e convencimento. Recomendado contratar uma empresa externa para treinamento e coaching, ou mesmo deixar que os gerentes de projetos conduzam estas atividades.

3) Cultura do “aqui usamos a metodologia do PMI”

Estruturas burocráticas, engessadas, cheias de documentações e templates com a desculpa de que “aqui usamos a metodologia do PMI”. Negativo! Em primeiro lugar saiba que o PMI não tem e nem é uma metodologia (leia mais sobre neste artigo). A burocracia e o excesso de documentação são criações das pessoas e não do PMI e suas boas práticas descritas no PMBOK.

Chances de sucesso de implementar uma estrutura projetizada: utilizar alguns princípios do Manifesto Ágil, principalmente “Indivíduos e Interações Mais Que Processos e Ferramentas” e “Software Funcional Mais Que Documentação Abrangente”.

4) Cultura do “agilidade na veia”

Geralmente empresas que começaram como startup, usando e abusando do extremo da filosofia ágil, onde o importante é entregar valor, sem se preocupar com prazo e custo. Quando estas empresas crescem e a gestão torna-se mais profissional, custo e prazo tornam-se restrições importantíssimas para as tomadas de decisão dos níveis estratégicos. Porém, as pessoas que trabalham no nível operacional, e que viram a empresa nascer através do extremo da filosofia ágil, não aceitam e não acreditam que precisam de processos estruturados de planejamento, monitoramento e controle de escopo, tempo e custo.

Chances de sucesso de implementar uma estrutura projetizada: Buscar equilíbrio entre ferramentas e técnicas do gerenciamento tradicional com a estratégia ágil de execução. Este equilíbrio é fortemente abordado em meu livro Gerenciamento Ágil de Projetos, lançado pela editora Brasport.

5) Cultura do “gerente de projeto do Microsoft Project”

Estruturas que não compreendem o verdadeiro papel de comunicador, integrador e líder de um gerente de projetos e subutilizam os profissionais. “Ah, o gerente de projetos está aqui para colocar as datas no Project, elaborar o Project Charter, cobrar, cobrar e cobrar quem for preciso e agendar as reuniões”. Aliás, um dia ainda juro que vou entender qual a mágica que existe por trás desse “cobrar, cobrar e cobrar”.

Chances de sucesso de implementar uma estrutura projetizada: Demonstrar para o corpo diretivo como o gerente de projeto pode ser melhor utilizado como líder, comunicador e integrador.

Estes são apenas alguns cenários com os quais me deparei na minha trajetória de quase 20 anos em projetos. Com certeza o amigo leitor deve ter enfrentado outros cenários diferentes destes que eu descrevi, então faço um convite para que compartilhem esta experiência comigo e com os demais leitores do PTI.

Abraços e até o próximo artigo ! 🙂

Vitor Massari

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Profissional com mais de 15 anos de experiência em projetos de software. Sócio-proprietário da Hiflex Consultoria, profissional PMP e agilista, acredita no equilíbrio entre as várias metodologias e frameworks voltados para gerenciamento de projetos.
Lema: "Agilista convicto sempre, agilista obcecado jamais"


2 Comentários

Jeferson Campodonio
1

Já vivenciei os cenários com a cultura do “fazejamento” e que inevitavelmente leva à cultura do “aqui sempre foi assim”.
Vejo que quando a empresa tem a cultura de valorizar em demasia os profissionais apenas pelo tempo de casa, de certa forma paternalista e agarrada em seu passado dificulta muito na profissionalização em relação ao planejamento.
Empresas com esse perfil precisam de pessoas com uma certa experiência de mercado para que possam agregar valor para o time. A senioridade é fundamental para essa mudança. No entanto, a cultura pode sufocar esta mudança e fadar a um quadro de profissionais com experiência “viciada” pela cultura da empresa, desperdiçando profissionais contratados com a finalidade correta mas que estão impedidos de atuar pelas circunstâncias.

Alex Bastos
2

Cenários muito bem descritos, mas acredito que foi superficial a parte relacionada a “Chances de sucesso de implementar uma estrutura projetizada”.

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